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Educação física é para atletas, para quem curte esporte ou quer atuar em academias? Veja o que é fato na carreira

31/07/2017

A carreira de educação física tem registrado crescimento constante no número de formados a cada ano. O principal motivo é o fortalecimento do mercado 'fitness' e a cultura de bem estar. Na edição 2016 do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) do Ministério da Educação, a carreira foi a quinta com o maior número de inscritos, ficando apenas atrás de administração, pedagogia, direito e medicina.

Os universitários podem esperar um curso que vai exigir teoria e prática, estudos constantes e conhecimentos tanto das áreas de ciências humanas quanto da natureza. Confira abaixo as principais dúvidas sobre a carreira:

As aulas são só prática de esportes? Não precisa estudar nada de teoria?
Resposta: NÃO. De acordo com Luciana Venâncio, professora do Instituto de Educação Física e Esportes da UFC, esse é um mito que precisa ser superado pelos estudantes que ingressam nos cursos. "As disciplinas do currículo de formação em educação física (licenciatura e bacharelado) dialogam com saberes de diferentes áreas do conhecimento com o objetivo de articular quatro dinâmicas específicas: da Cultura, do Movimento, do Corpo e do Ambiente. Temos atualmente, por exemplo, disciplinas que buscam articulação de conhecimentos em práticas integrativas, que envolvem estudos e reflexões de antropologia e filosofia para compreender questões corporais do organismo humano no mundo contemporâneo."

Matheus, que está no quarto ano da faculdade, diz que só descobriu o lado “acadêmico” da área depois de passar no vestibular. “É um meio muito pouco valorizado, a gente produz muito conhecimento que é usado em outras áreas, nutrição, medicina, é um meio que abre um leque muito grande de opções, e eu não sabia, achava que era simplesmente escola e academia, aí descobri que poderia fazer um milhão de outras coisas”, diz.

Precisa ser atleta para se dar bem no curso?
Resposta: NÃO. Luciana, da UFC, explica que as aulas, viências e pesquisas durante a graduação ajudam o estudante de educação física a "desmistificar" o que ela chama de "uma ideia equivocada" de que, para ser profissional da área, é preciso ter as mesmas "competências exigidas de um atleta".
Roberto Pereira Furtado, professor do curso de educação física na Universidade Federal de Goiás (UFG), acrescenta que, atualmente, as pessoas que buscam o bacharelado na área em geral não têm interesse em competir em algum esporte: "Na profissão, hoje em dia, quando as pessoas buscam o curso de bacharelado, boa parte delas têm interesse em construir uma carreira como personal trainer", explica ele.

Daiane dos Santos lembra que, ao contrário de outros países, no Brasil não existe a exigência de que o estudante de educação física seja atleta.
"Na Rússia, por exemplo, você não pode fazer educação física se não foi atleta. Eu, Daiane, não posso dar treino de judô porque não fiz judô. Alguns países têm essa doutrina, o Brasil não tem."
(Daiane dos Santos, ex-ginasta e profissional de educação física)

Além disso, ela afirma que a especialização em um esporte não garante que a pessoa tenha conhecimento de todas as áreas abordadas na graduação. "Entendo muito de ginástica, mas não entendo de todos os esportes. Eu sou especialista na ginástica. Mas só na ginástica, e na ginástica artística. Tem a laboral, rítmica, acrobática, aeróbica... Eu estou na vantagem só em um ramo."
Matheus, que é atleta profissional de squash e estuda esporte, diz ainda que, além de não ser preciso praticar o esporte em alto nível para seguir a profissão, há outras habilidades e interesses que são essenciais para se dar bem na área. “A primeira coisa é que tem que gostar muito de trabalhar com pessoas, gostar muito de interagir, não pode entrar nesse meio achando que nunca vai trabalhar com pessoas.”

A maioria dos formados vai se tornar professor de escola e ganhar mal, ou virar técnico e ganhar bem?
Resposta: NÃO. Embora haja dois percursos na graduação – a licenciatura e/ou o bacharelado –, as oportunidades de trabalho, principalmente no bacharelado, são cada vez mais amplas.
Luciana, professora da UFC, afirma que, na realidade, a maioria dos técnicos de modalidades esportivas não ganham altos salários.
"Essa questão dos técnicos de equipes esportivas, principalmente o de futebol ou de voleibol, ganharem salários vultosos, provoca uma ilusão profissional." (Luciana Venâncio, professora da UFC)
"Temos várias categorias de atletas que dependem de técnicos para atuarem nas bases. Essa ilusão profissional é construída, muitas vezes, pelas mídias brasileiras, na chamada 'falação esportiva'."

No outro extremo, a ideia de que professores sempre ganharão mal não está tão descolada da realidade, mas existem exceções, lembra Furtado, da UFG. "Apesar da realidade da carreira como professor da educação básica no Brasil ser bastante desvalorizada, há possibilidades de inserção. Em algumas existem algumas possibilidades diferenciadas de remuneração maior. A remuneração baixa na escola não é uma regra, embora seja bastante precária no Brasil", afirmou ele.
Luciana diz ainda que essas oportunidades de trabalho dependem de uma série de fatores, inclusive "do envolvimento de cada um com a própria formação (inicial e permanente)", e lembra que, em casos de professores concursados em institutos federais, o salário depende de títulos como mestrado e doutorado.

Os professores ressaltam que a expansão do mercado, com a inclusão de vagas de emprego em postos de saúde, hospitais e cada vez mais academias, buscando um público mais amplo, como crianças e idosos. "O 'fitness' de fato teria uma ênfase maior na questão física, isso envolve mais o público mais jovem, mas hoje em dia essa própria indústria do fitness já se amplia e utiliza uma nomenclatura diferente, que é 'wellness'. Seria uma lógica de bem-estar, mas é no mesmo campo de trabalho", explica Furtado.

Quem faz educação física só quer jogar bola ou é preguiçoso?
Resposta: NÃO. "Para poder concluir o curso é necessário estudar bastante como em qualquer outro curso superior", resume o professor Roberto Pereira Furtado. Matheus Carbonieri, que atualmente está no quarto ano da graduação na USP, assina embaixo.

"Tem que entrar em educação física sem acreditar naquela máxima de que não estuda. É um meio que tem que estudar sim, como em qualquer área, tem que estudar bastante."
(Matheus Carbonieri, estudante da USP)

Ele acrescenta, ainda, que o profissional ainda precisa fazer diversos cursos de especialização para se manter atualizado. "Tem que estar preparado para nunca parar de estudar."

Daiane dos Santos é prova disso. Além da carreira de sucesso e da graduação plena em bacharelado e licenciatura, ela se especializou em gestão esportiva. "Já tinha empresa há bastante tempo, queria me aprofundar na parte de gestão", contou ela. "O profissional precisa estar sempre se atualizando. Tem que ser ousado, visionário, é uma MEI, é um microempreendedor ali, o profissional de educação física. Assim como todo mercado, educação física também muda", disse a ex-ginasta.

A carreira de quem faz educação física é curta, como a de atletas?
Resposta: não. Furtado, da UFG, afirma que não é obrigatório ser jovem para atuar na área da educação física. "Depende muito daquilo que o sujeito quer do ramo, na profissão que ele vai seguir. Por exemplo, o professor na escola normalmente vai seguir sua carreira até a aposentadoria. Em outros campos da saúde também", diz ele, lembrando que "o alto rendimento no ramo do esporte competitivo não é o que mais emprega na educação física".

"Tem muito campo de trabalho hoje", diz Daiane.

"Tem para todas as idades, desde um jovem ou alguém mais maduro, você pode estar engajado na educação física." (Daiane dos Santos)

Além disso, o professor ressalta que, dentro do ramo do esporte de competições, há uma série de áreas técnicas nas quais é possível se especializar. "Dentro de uma equipe de alto rendimento o profissional pode trabalhar como técnico, preparador físico, fisiologista, auxiliar técnico, preparador de goleiros no caso do futebol", lista ele.

Professora da UFC, Luciana Venâncio complementa que o tempo de permanência em uma carreira é subjetivo tanto na educação física quanto em outras áreas. "Tem relação com objetivos de vida (que podem mudar ao longo da história de vida de cada um), com realização e reconhecimento profissional. São vários fatores subjetivos que implicam a carreira de qualquer profissional."

Fonte: G1 - Educação